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Direitos Humanos: Norte e Nordeste respondem por mais de 63% dos casos de violência em 4 anos no Brasil

As regiões Norte e Nordeste do Brasil concentram 63,9% dos casos de violência contra defensores dos direitos humanos nos últimos quatro anos, segundo estudo das organizações não-governamentais Terra de Direitos e Justiça Global. O Pará lidera a lista entre todos os estados do Brasil: foram 143 casos de violência registrados entre 2019 e 2022. O segundo colocado da lista é o estado do Maranhão, com 131 casos.

Assassinatos

Quando o assunto é estritamente o número de assassinatos, o Maranhão aparece no topo da relação, com 26 casos, seguido do Amazonas e do Pará, com 19 casos, e Rondônia, com 18 casos.

47% dos casos de violência contra defensores dos direitos humanos registrados no Brasil envolvem violências contabilizadas na área da Amazônia Legal, o que explicita um acirramento dos conflitos territoriais e ambientais na região.

Em todo o Brasil, foram 1171 casos de violência, sendo 169 assassinatos e 579 ameaças. Em 11 dos assassinatos, há sinais de tortura.

É o caso dos assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, no Vale do Javari, no Amazonas, em junho de 2022.

Ambos foram emboscados e mortos quando viajavam de barco pela região. Segundo as investigações, eles foram assassinados a tiro, queimados e enterrados.

O crime teria sido motivado pelo trabalho desempenhado por Bruno na denúncia de pesca ilegal em território indígena.

Os dados do levantamento destacam que defensores indígenas foram alvos de grande parte das violências sofridas, respondendo por 346 casos, sendo 50 assassinatos e 172 ameaças.

A maior parte (63,3%) dos assassinatos foi provocada por arma de fogo. Já a média de idade das pessoas assassinadas é de 41 anos.

Trata-se da quarta edição do estudo intitulado Na linha de frente: violência contra defensores e defensoras de direitos humanos no Brasil.

A pesquisa considerou casos de violência todas as ocorrências motivadas pelo objetivo de impedir a reivindicação e defesa de direitos.

Elas foram categorizadas em oito tipos: ameaça, agressão física, assassinato, atentado, criminalização, deslegitimação, importunação sexual e suicídio.

Além disso, o levantamento considerou casos de violência individuais e contra coletivos, como por exemplo ataques contra povos indígenas e quilombolas.

Responsáveis pelas violações

Na maioria dos assassinatos foram fazendeiros, garimpeiros, seguranças privados ou outros atores pertencentes à tipologia de agentes privados que praticaram os crimes.

Eles respondem por 343 ocorrências de 450 ocorrências desse tipo em que foi possível identificar o agente violador.

Já os agentes públicos estiveram envolvidos em 279 ocorrências como violadores, estando mais frequentemente associados a violações de criminalização (100 casos) e deslegitimação (37 casos).

Os agentes públicos, em particular membros das polícias, estiveram envolvidos em 26 casos de assassinatos e em 46 casos de ameaças. Em alguns casos, a polícia também é citada como corresponsável ao lado de fazendeiros e jagunços.

Dados da violência contra defensores de direitos humanos no Brasil entre 2019 e 2022: 

3 defensores de direitos humanos assassinados por mês

1/3 dos casos de assassinatos de defensores foi registrado entre o segundo semestre de 2021 e o primeiro semestre de 2022

292 casos de violações contra mulheres

34% contra pessoas identificadas como pretas ou pardas

58% contra indígenas

78,5% dos crimes são ligados a conflitos territoriais e ambientais

Relembre casos marcantes no Pará:

Ameaças à liderança indígena Alessandra Korap Munduruku, na Aldeia Praia do Indío, em Itaituba

Atual presidente da Associação Indígena Pariri, Alessandra Korap atua na defesa dos territórios do povo Munduruku. Em 2020, recebeu o prêmio Robert F. Kennedy de Direitos Humanos. Também recebeu o Prêmio Goldman de 2023, considerado o “Nobel” do ativismo ambiental.

A atuação de Alessandra já rendeu a ela uma série de ameaças. Em novembro de 2021, quando voltava da 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), ela teve a casa invadida e furtada, em Santarém, no sudoeste do Pará.

Os criminosos levaram documentos e valores que seriam usados na assembleia do Povo Munduruku.

O ataque ocorreu meses depois de garimpeiros terem impedido a passagem de um ônibus com indígenas da Terra Munduruku que seguiria para Brasília, em junho de 2021. Atualmente, Alessandra está incluída no Programa de Proteção a Defensoras e Defensores de Direitos Humanos do Pará.

Assassinato de Fernando Araújo dos Santos – Trabalhador rural sem-terra e homem gay, em Pau D’arco, no dia 26 de janeiro de 2021

O camponês Fernando Araújo dos Santos foi assassinado com um tiro na nuca, no próprio lote de terra onda vivia, enquanto preparava uma mudança prevista para o dia seguinte. Ele iria se mudar por conta da série de ameaças de morte que vinha sofrendo.

Trabalhador rural sem-terra e homem gay, Fernando foi um dos sobreviventes e uma das principais testemunha da chacina conhecida como Massacre de Pau D’arco, quando policiais militares e civis assassinaram dez trabalhadores rurais que ocupavam a Fazenda Santa Lúcia, na cidade de Pau D’arco, no Sudeste do Pará. No massacre, que ocorreu em 2017, Fernando viu o namorado ser assassinado.

Os policiais responsáveis pela chacina permanecem trabalhando e aguardam julgamento em liberdade. Fernando chegou a ser inserido no Programa de Proteção a Testemunhas, mas decidiu voltar ao seu lote na Fazenda Santa Lúcia, onde foi assassinado.

Criminalização do advogado popular José Vargas Sobrinho Júnior, preso em 1º de janeiro de 2021, em Redenção 

Advogado popular e defensor dos direitos humanos, José Vargas Júnior foi preso em janeiro de 2021 acusado de ter participado do desaparecimento e assassinato de Cícero José Rodrigues, presidente da Associação de Pessoas Portadoras de Epilepsia de Redenção.

O indiciamento do defensor se deu com base em trocas de mensagens em tom de piada e a prisão é marcada por uma série de ilegalidades.

Foram ignoradas as provas da inocência de Vargas na investigação e a defesa do advogado ficou meses sem ter acesso às provas que basearam o indiciamento.

Antes de ser preso, Vargas representava as famílias das vítimas do chamado Massacre de Pau D’arco. Por conta das denúncias do abuso e das ilegalidades das polícias nesse caso, e por sua atuação junto a trabalhadores sem-terra, vinha sofrendo uma série de ameaças que o levaram a ser incluído no Programa de Proteção a Defensoras e Defensores de Direitos Humanos.

Assassinato de Dilma Ferreira, do Movimento dos Atingidos por Barragens, em Baião, no dia 22 de março de 2019

Dilma foi coordenadora regional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) na região de Tucuruí, Pará, e foi assassinada em 2019, dentro de casa.

O marido dela, Claudionor Costa da Silva, e um amigo do casal, Hilton Lopes, também forma mortos. A defensora foi uma das 32 mil pessoas deslocadas durante a construção da megabarragem de Tucuruí.

A ativista se tornou internacionalmente reconhecida e pressionava o governo brasileiro a adotar uma legislação que estabelecesse os direitos das pessoas deslocadas para construção de barragens, proporcionando-lhes uma compensação.

Às vésperas do crime completar quatro anos, em março de 2023, Justiça do Pará condenou Cosme Alves, um dos assassinos da militante, a 67 anos, 4 meses e 24 dias de prisão.

Ameaças de morte a quatro lideranças indígenas e extrativistas da Reserva Extrativista (Resex) Tapajós Arapiuns, em Santarém, em maio de 2021

As ameaças contra lideranças do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns (Cita) e do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares de Santarém (STTR) se intensificaram após ação movida pelas duas entidades para paralisar os planos de manejo florestal dentro da Reserva Extrativista (Resex) Tapajós Arapiuns. Em 2023, as ameaças permanecem: agora, além estarem voltadas contra a indígena Auricélia Arapiun, coordenadora do Cita, também se voltam contra a presidente do STTR, Maria Ivete Bastos, contra o vice-presidente do STTR e liderança da Federação de Associações de Moradores do PAE Lago Grande, Edilson Silveira, e contra a presidente da Tapajoara- Organização da Resex Tapajós Arapiuns, Maria José Caetano.

Edilson já havia sido ameaçado em 2022, assim como sua esposa Rosenilce Victor, por conflitos territoriais dentro do Projeto de Assentamento (PAE) Agroextrativista Lago Grande – um território marcado por conflitos envolvendo a regularização fundiária do PAE e pela exploração minerária da Alcoa. Por conta das ameaças, o casal aguarda análise para inclusão no Programa Estadual de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos.

Maria Ivete Bastos também foi acompanhada durante 10 anos pelo Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos, por conta das ameaças que recebia por denunciar crimes cometidos por fazendeiros e grileiros de terras.

O contexto de conflitos e de ameaças está sendo acompanhado pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos, que realizou uma missão ao território entre os dias 14 a 19 de maio. Um relatório da missão deve ser apresentado pelo CNDH em breve.

Nos dias 15 e 16 de maio, embaixadores da União Europeia também devem visitar a Resex Tapajós-Arapius para averiguar a situação.

 

Fonte: Oliberal

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